quarta-feira, 20 de maio de 2009

A Técnica de Partida: Instrumento de Avaliação

Apresento um pequeno trabalho de avaliação da técnica de partida, útilizando apenas uma máquina fotografica digital com função para efectuar filmagens, um software de avaliação biomecânica de fácil manuseamento (ATD) e o Movie Maker para poder efectuar frames a partir do filme efectuado. Assim podem avaliar a técnica de partida dos nadadores no seu dia a dia de treino sem necessidade de recorrer a um biomecânico. Obviamente que todos gostaríamos de poder contar com a colaboração de um especialista, efectuando uma avaliação mais rigorosa, mas podemos certamente usar este procedimento com algum rigor e consistência, permitindo pequenas correscções e ajustes, através de avaliações regulares.

Nota Introdutória: A técnica é um factor importante e sempre presente e a sua execução deve ser continuadamente readaptada às alterações de todo o tipo que acontecem, não só durante o crescimento, mas também perante as modificações que sofre o organismo humano durante a evolução desportiva. Assim, é muito importante conhecer a técnica ideal, ou seja, o padrão técnico de movimentos universalmente aceites pelo conhecimento científico, pelas bases teóricas e pela experiência prática, uma vez que não terá uma correlação exacta em cada nadador (Navarro, 1999).
O rendimento de um nadador em competição é determinado em função do tempo total percorrido desde o sinal de saída até finalizar a distância da prova, definida em cada caso pelo regulamento. O nadador que gaste menos tempo no final da sua prova será o que alcançará a vitória na competição, mas podemos obter outros dados importantes para o treinador, com a finalidade de poder analisar a prestação do seu nadador segundo diferentes parâmetros. Assim, podemos analisar as diferentes provas de natação não como um todo, mas sim como uma sucessão de várias fases intermédias. Desta forma o tempo de prova será um somatório do rendimento alcançado em cada uma das fases que a compõe:

  • Partida
  • Nado
  • Viragem
  • Chegada

A partida é parte fundamental nas provas de Natação, podendo ser o agente discriminativo da derrota ou da vitória, especialmente nas provas de distância mais curta (Navarro e Col., 1990 e Goldsmith, 1999). Vários autores já demonstraram a importância da partida nesta modalidade, referindo, por exemplo, Maglisho (1993) que o tempo despendido na partida é cerca de 25% do tempo total em provas de 25m, 10% em provas de 50m e 5% em provas de 100m. Desta forma, sobretudo no caso de nadadores principiantes e em formação que evidenciam técnicas de partida particularmente deficientes, uma melhoria da técnica de partida pode-se saldar num ganho de tempo considerável.Após sinal do árbitro para subir ao bloco de partida, o nadador coloca os pés na parte da frente da plataforma, agarrando-se com as mãos ao mesmo. Alguns nadadores preferem situar as mãos entre os pés ligeiramente separados ou lateralmente em relação aos pés, sensivelmente à largura dos ombros (Maglischo, 1995). Está posição permite que o nadador avance de forma mais rápida o centro de gravidade para a frente (Maglischo, 1995 e Chollet, 2003).

Eficácia: A eficácia de um movimento técnico desportivo vem determinada pelo grau de semelhança relativamente aos parâmetros ideais, sejam eles biomecânicos, fisiológicos, estéticos ou psicológicos que caracterizam o modelo técnico desportivo (Redín e Larrea, 2008).
Distinguem-se três tipos de indicadores de eficácia das acções técnicas:

  • Eficácia absoluta.
  • Eficácia comparativa.
  • Eficácia de realização.

Por outro lado, o indicador mais efectivo de aproximação do movimento ao modelo técnico desportivo ideal também pode ser o resultado desportivo ou rendimento obtido. Assim, a técnica mais eficaz será aquela que garanta a execução do mais alto resultado.

Eficácia absoluta
Neste parâmetro comparamos os valores dos indicadores da técnica do movimento dos parâmetros biomecânicos, tais como:

  • Ângulo do joelho em posição inicial.
  • Ângulo de flexão máxima do joelho.
  • Ângulo de saída do bloco de partida.
  • Ângulo de entrada na água.
  • Distância de voo.

Eficácia comparativa
A eficácia comparativa, é aquela que resulta da comparação da técnica do movimento que se avalia com a técnica dos desportistas de elite ou de elevada mestria técnica. Em certas ocasiões devido ao estilo pessoal de cada desportista é aconselhável realizar esta comparação tendo por referência um desportista modelo que tenha as mesmas características antropométricas, de condição física ou psicológicas similares às do atleta em estudo (Redín e Larrea, 2008).
Neste estudo realizamos a análise do nosso nadador comparando-a com resultados de vários estudos realizados por investigadores tais como Maglischo, Chollet e Hajland.

Eficácia de realização
Este tipo de determinação da eficácia consiste em avaliar a efectividade da técnica baseando-se no potencial motor de realização. Compara-se o resultado alcançado em competição com o resultado hipotético (calculado a partir das capacidades funcionais do atleta) que o desportista poderia ter obtido se tivesse uma técnica de movimento de máxima eficácia que permitisse aproveitar 100% das suas capacidades motoras (Redín e Larrea, 2008).
No nosso estudo procuramos analisar a diferença entre o resultado devido e o resultado real como indicador da eficácia da técnica.

Grau de aproveitamento do potencial
Se o resultado devido e o resultado real coincidem, o nível de mestria técnica ou grau de domínio técnico do desportista considera-se elevado e inclusivamente em casos excepcionais de eficácia técnica pode chegar mesmo a superar o registo obtido relativamente ao hipotético (ideal) (Redín e larrea, 2008).
Obviamente que quanto maior seja a diferença a favor do resultado hipotético, menor será a qualificação técnica do atleta.

Objectivos e protocolo de Medição

Objectivos de Medição
A avaliação da mestria técnica pretende:
1) Enquadrar o atleta de acordo com o seu nível: será necessário conhecer onde se encontra o nosso desportista de forma global relativamente a atletas de alto rendimento desportivo e de acordo com as suas possibilidades futuras.
2) Determinar um ponto de partida adequado para o processo de formação desportiva: para o qual fará falta definir de forma explícita os aspectos positivos ou virtudes e os negativos. Parece também essencial poder diferenciar o principal do acessório para o qual se propõem uma série de reflexões a ter presente.


Protocolo de Medição
Para a recolha de dados e procedimentos de medição, foram utilizados os seguintes equipamentos:

  • Câmara Fotográfica com possibilidade de realização de filme.
  • Software de análise cinemática ATD.

A câmara fotográfica foi colocada num tripé, lateralmente ao bloco de partida de forma a ter no campo de filmagem 5 metros. A máquina fotográfica foi colocada em função de filmagem. O nadador preparou-se para realizar a partida na pista número 3, situada a 6 metros da posição lateral da câmara fotográfica. A partida foi dada segundo as regras da FINA (2005-2009).
Depois de recolhida a informação pretendida, um filme em formato “mpeg”, retiramos fotogramas no programa do Windows denominado “Movie Maker”, com um intervalo de 0,16 segundos. Posteriormente, denominamos os ficheiros recolhidos de “salto001… até …salto013”, os quais foram abertos com o programa de análise cinemática ATD.
Neste programa depois de definirmos uma referência x (0,5 m), realizamos as seguintes análises:

  • Ângulo do joelho em posição inicial.
  • Ângulo de flexão máxima do joelho.
  • Ângulo de saída do bloco de partida.
  • Ângulo de entrada na água.
  • Distância de voo.

Resultados: Realizamos as seguintes análises, porque:

  • Ângulo do joelho em posição inicial – a análise deste ângulo é fundamental pois condiciona fortemente o tempo que o nadador demora a transitar de uma posição estática para uma posição dinâmica, ou seja, condiciona a velocidade de reacção ao sinal de partida.
  • Ângulo de flexão máxima do joelho – a análise deste ângulo é fundamental pois condiciona fortemente a potência de força aplicada no bloco de partida durante a realização da impulsão, que antecede a fase de voo.
  • Ângulo de saída do bloco de partida – a análise deste ângulo é fundamental, uma vez que o ângulo de saída aliado à velocidade de saída do bloco e ao peso do nadador, condiciona a trajectória ascendente durante a fase de voo.
  • Ângulo de entrada na água – a análise deste ângulo é fundamental, uma vez que o ângulo de entrada na água do nadador poderá condicionar todas as restantes fases subaquáticas da partida.
  • Distância de voo – a análise deste parâmetro permite-nos saber a efectividades dos parâmetros anteriores.

Após o processo de observação e recolha de dados obtivemos resultados relativamente aos parâmetros definidos para a análise biomecânica da partida de crol. Os resultados obtidos foram os seguintes:

  • Ângulo de flexão do joelho na posição inicial (ATD) – 126,24º.
  • Máxima flexão do joelho durante a partida (ATD) – 93,07º.
  • Ângulo de saída do bloco de partida (ATD) – 23,07º.
  • Ângulo de entrada na água (ATD) – 43,88º.
  • Distância de voo (ATD) – 3,04 m.

O armazenamento dos resultados obtido no presente estudo, foram apresentados em forma de fotograma com os respectivos dados fornecidos pelo software de análise cinemática – ATD. Desta forma poderemos expor ao nadador em estudo, os seus resultados visualmente e numericamente, explicando-lhe as suas diferenças relativamente a resultados de outros estudos efectuados com nadadores de elevada mestria técnica.

Análise e Discussão dos Resultados: Segundo estudos sobre a partida de crol, os resultados obtidos em nadadores de alto rendimento desportivo com elevada mestria técnica, são os seguintes:

  • Ângulo de flexão do joelho na posição inicial (ATD) – Avanço do centro de gravidade (Maglischo, 1995 e Chollet, 2003).
  • Máxima flexão do joelho durante a partida (ATD) – 90,00º (Maglisho, 1995).
  • Ângulo de saída do bloco de partida (ATD) – Abaixo dos 13,00º (Miller e Col., 2002; Groves e Roberts, 1972 e Hay, 1981).
  • Ângulo de entrada na água (ATD) – 28.64º a 39.44º (Vilas-Boas e Col., 2000), 40º a 50º (Maglischo, 1995) e 26º a 54º (Counsilman e Col., 1988).
  • Distância de voo (ATD) – A média dos nadadores com 2,80 m e os melhores com 3,41 m (Hajland, s/d).

O processo de observação e recolha de dados permitiu a obtenção de resultados relativamente aos parâmetros definidos para a análise biomecânica da partida de crol (eficácia absoluta). A recolha de resultados obtidos em estudos semelhantes com nadadores de elite, permitiu estabelecer um termo de comparação entre o nosso nadador e aqueles que apresentam os melhores resultados desportivos (eficácia comparativa).
Assim, relativamente ao resultado obtido no ângulo de flexão do joelho na posição inicial (ATD) foi de 126,24º, permitindo que o nadador avance de forma mais rápida o centro de gravidade para a frente (Maglischo, 1995 e Chollet, 2003). Esta evidência, permite que o tempo entre a transição de uma posição estática para uma posição dinâmica seja menor, apresentando melhores resultados na velocidade de reacção ao sinal de partida.
O resultado obtido relativamente à máxima flexão do joelho durante a partida (ATD) foi de 93,07º, valor muito semelhante ao apresentado por Maglischo (1995), ao referir que quando o nadador ouve o sinal de partida, o nadador realiza uma tracção para a frente pela parte anterior do bloco de partida para favorecer o balanço do corpo para a frente. Nesta fase acentua-se a flexão das pernas, aproximadamente 90º.
Quanto ao ângulo de saída do bloco de partida (ATD) o resultado obtido foi de 23,07º, sendo este mais elevado do que o obtido por Miller e Col. (2002), por Groves e Roberts (1972) e por Hay (1981). As médias encontradas por estes investigadores apresentam valores bastante próximos dos 13º, considerando este ângulo de saída do bloco de partida como óptimo. Afirmam ainda que variações angulares abaixo dos 13º - como observado nestes estudos - conduzem a melhores execuções em relação a variações acima deste valor.
O ângulo de entrada na água (ATD) obtido nosso estudo foi de 43,88º. Podemos considerar que o valor obtido é semelhante ao encontrado nos estudos de Vilas-Boas e Col. (2000), que descrevem ângulos de entrada que variam entre 28.64º e 39.44º quando utilizada a técnica track start, sendo também compatível com o proposto por Counsilman e Col. (1988), que apresentam uma variação entre 26º e 54º, independente da técnica utilizada. Também Maglischo afirma que o ângulo do primeiro contacto com a água, desde a cabeça até à anca, deve ser aproximadamente de uns 40º a 50º.
Uma vez que o ângulo de entrada é semelhante aos valores apresentados em estudos com os nadadores de elevada mestria técnica e tendo em consideração que Miller e Col. (2002) afirmam que maiores ângulos de entrada na água tendem a proporcionar menores distâncias de voo, então seguindo esta lógica o nosso nadador apresentaria um valor de distância de salto muito semelhante aos apresentados pelos melhores nadadores. Efectivamente o resultado obtido em relação à distância de voo (ATD) foi de 3,04 m, valor este bastante superior ao valor médio obtido por Hajland (s/d), 2,80 m, mas ainda bastante inferior ao observado nos melhores do mundo, 3,41 m.
Muito provavelmente esta diferença deve-se ao facto de ter apresentado um ângulo de saída muito alto relativamente aos nadadores de elevada mestria técnica, conduzindo a uma execução técnica menos eficaz, aliando este facto técnico a possibilidade de utilizar totalmenta todo o potencias das suas capacidades condicionais força e flexibilidade, bem como habilidades psicológicas tais como a concentração. Pensamos que por estas razões, o nosso nadador poderia ter obtido um melhor resultado na partida de crol, se tivesse uma técnica de movimento de máxima eficácia que permitisse aproveitar 100% das suas capacidades motoras. O seu resultado real ainda se encontra um pouco distante do resultado hipotético.

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